Para Luciana Gomes.
Na sexta-feira, quando decidi passar o final de semana em Xerém (novamente) o fiz por três motivos distintos:
1- Estava sem dinheiro, fim de mês atrai bolso vazio, é a lógica proletária;
2- Estava morrendo de saudade da minha família, principalmente do meu sobrinho;
3- Estava frio e chovendo e eu adoro o frio úmido da serra.
Se o tédio não se intrometesse, eu ficaria na boa, certamente o final de semana seria maravilhoso, era só eu mantê-lo longe que aproveitaria o ócio e o ar fresco pra produzir boas idéias. Então, enfiei umas revistas e dois livros na mochila, coloquei também um short de dormir, uma camiseta branca, remédio de nariz (frio é bom, mas nem tanto) e parti na tarde de sábado feliz da vida.
Essas viagens de ônibus dão tempo de você fazer um monte de coisas entre os pontos de partida e de chegada. Algo que possa ser manipulado no espaço entre o tórax e o encosto da poltrona da frente, ou seja, ler. Livros, jornais, revistas, nada de fazer as unhas, descolorir os pelos ou arriscar uma cantoria. Colocar a leitura em dia é, e sempre será, a melhor opção nesses casos.
De dentro da mochila, entre as últimas edições da revista Veja e dois livros -
O Mundo de Sofia (romance da historia da filosofia) e
O Pessimismo e Suas Vontades -, ambos de filosofia, tirei o segundo e resolvi reler uns trechos do trabalho do alemão
Arthur Schopenhauer e logo fui tragado para dentro das páginas pelo fluxo “hemorrágico” das suas idéias e absorvido por uma força que fez o tempo passar rápido, empurrando a luz do sol para baixo das rodas e pintando com as cores da noite a janela atrás da cortina. Esforcei-me para não reler Marx e Darwin no primeiro livro para dar uma atenção a outro queridíssimo filósofo e suas magníficas teorias.
Sendo raso mesmo quando Schopenhauer merece profundidade, vou falar rapidinho do que mais intriga na sua maneira de pensar, a vontade. Segundo ele, a vontade torna o homem miserável porque faz do desejo a sua força vital. Ele vive porque deseja conquistar algo, trabalha porque tem necessidades, casa-se porque precisa se relacionar e depois que realiza todos os seus desejos, volta à posição de miserável (lê-se necessitado) e logo busca outra razão para continuar vivendo. Então muda de trabalho, troca de carro, de mulher (marido), vende a casa que lutou tanto pra conseguir e faz qualquer coisa que possa libertá-lo do fracasso de simplesmente viver tranquilamente. Inspira-se na sociedade louca e consumista e motiva-se pelo querer, que geralmente nasce do interesse pela vida do outro.
Cansativo demais, eu concordo, mas fazemos isso o tempo todo sem perceber e colocamos a felicidade exatamente no final desse desejo, onde começa a realização, mas também, onde começa a contagem regressiva para uma nova necessidade e o início de uma nova epopéia sem fim.
Meu final de semana interio se resumiu a isso. Lembrei-me que quando estava bem de grana não passei por nenhum período depressivo, e que agora, do dia 1º ao 5º dia útil de todo mês, para cada conta, um Diazepan de 10mg. Já comprei toda a felicidade que pude, calças, camisas, sapatos, férias na Europa. Construí uma casa, fui plenamente satisfeito. Agora desejo um monte de coisas novas que não posso ter por enquanto e já me sinto mal. Será que eu quis pouco e trabalhei demais e agora apresento cansaço? Será que se eu quiser menos e trabalhar o equivalente terei mais qualidade de vida e serei mais feliz? Em que ponto a felicidade pode ser saudável se no momento em que ela se torna plena colocamos tudo a perder?
Será que precisamos desejar menos para vivermos mais e estancar essa sucessão de vontades e satisfações que nos empurram para o vazio a todo tempo? O pêndulo entre a necessidade e a satisfação deve oscilar menos entre os extremos, quase parando, para que o sofrimento por
não ter o que se deseja não produza tanta gente emocionalmente instável, antiética e imoral. O homem do SER deve ser maior que o homem do TER, esse é o caminho da verdadeira felicidade e já está dentro de nós.
Antes de voltar pra casa ainda ouvi da minha mãe que eu estava muito anti-social no final de semana. Não dá pra pensar e refletir tanto e ao mesmo tempo alimentar tartarugas, dar banho no cachorro e “plantar bananeira” pra fazer meu sobrinho sorrir. Uma coisa de cada vez, neste final de semana foi preciso relativizar a felicidade para eu começar a viver melhor.
L.P.