Bem-vindo ao Cromossomo XY

Este blog não pretende ser correto, fonte de pesquisa ou referência para seus interessados. Ele foi pensado para que outros homens e mulheres entendam melhor como nós (homens) podemos ser românticos, chatos e invariavelmente humanos. O que pensamos das artes, das coisas que não entendemos e principalmente de nós mesmos. Neste blog há espaço para homens de todas as idades, raças, classes sociais e orientação sexual. É feito de pensamentos livres, sem dogmas culturais ou religiosos.


Seja bem-vindo ao Cromossomo XY.



terça-feira, 20 de novembro de 2012

Liberdade. Eu me chamo solidão.


Uma das coisas que mais gosto de fazer na vida é pedalar. Sentir o vento no rosto, o suor escorrendo nas costas, a tensão nos músculos, tudo isso me enche de vida e amplia minha sensação de liberdade, não só a liberdade de fazer o que quero, mas aquela do desprendimento do corpo, aquela que faz os pássaros mergulharem no céu em voos rasantes sem motivos.

Num traçado magnífico entre a Marina da Glória e o Aterro do Flamengo, desde a enseada de Botafogo e a orla de Copacabana até Ipanema e Leblon, fiz a corrente da minha bicicleta ranger entre a coroa e os peões mais de um milhão de vezes. Em escaladas vigorosas no pedal me lancei rumo a uma direção onde só à liberdade me guiava, eu só sabia onde queria chegar e para onde precisava voltar no final. Meu caminho e a mesma liberdade que rege o vento; O mar, sempre generoso, que serve de margem ao meu traço imaginário; Sob o sol e o olhar perdido de milhares de testemunhas desfrutei da beleza das ruas coloridas de etnias. Todas estas coisas me ajudaram a perceber que a liberdade é quase 50% constituída de solidão. Uma é condição da existência da outra, sem exceção a regra.

Gente por toda parte com saudade do sol que deixou a cidade cinza quase cinco dias. Uma multidão que caminhava desordenada por todos os lados. As janelas, nos edifícios da orla, salpicadas de vultos solitários e muita gente acompanhada de ninguém. Tudo isso me fez pensar naqueles quase 15% da população residente no Rio feita de migrantes que vieram para cá nos últimos cinco anos, e principalmente, no motivo que as fizeram mudar tão radicalmente suas vidas.

Abandonar a família, lugares e a própria história, elementos que compõem nosso DNA, nos fragiliza e nos torna alvo fácil da saudade. É um ciclo vicioso. A saudade nos faz usar mal a liberdade, optar pelo excesso de atividades, vícios e administrar mal nosso dinheiro. Depois nos aprisiona e revela a outra face de ser livre, a extrema solidão. É o cachorro atrás do rabo, você decide ser livre e acaba preso a um sistema que você mesmo criou. Ao longo da vida percebi que muitos grupos são formados por pessoas sem familiares por perto numa corrente antissolidão, como se fosse um antídoto, uma espécie de amor sintético, algo que sirva como família mesmo que não possam chamá-los assim. Passam sua existência de grupo em grupo como um nômade de sentimentos, absorvem o que precisam e saem. Claro que este caso está cheio de exceções! Outras pessoas resolvem bem esta falta exatamente porque gozam de amor genuíno estando constantemente entre os seus e o resultado é mais segurança, menos exposição e saúde abundante. Até na vida profissional, quem tem família por perto tende a ter mais sucesso.

Voltando a liberdade, seja qual for o motivo que nos leva a buscá-la - seja para sair do armário (ou entrar nele), ser hippie, estranho ou excêntrico - a solidão certamente estará no meio do caminho e em algum momento esbarraremos com ela. Algumas pessoas encaram muito bem esta condição, outras piram, adoecem e acabam voltando para casa piores que quando saíram. Amargos e derrotados. O que nunca devemos esquecer é que muita liberdade aprisiona. Seja o que for que te faça buscá-la use como guia os seus valores e jamais rompa com a sua origem. Muitos erros são por ocorrência da solidão e pela vã irresponsabilidade do nosso Sistema de Recompensa que nos permite a toda hora errar mais um pouquinho de tanto que merecemos "escapismos" até não enxergarmos a luz que ilumina a liberdade verdadeira.

L.P.

“A maior ironia da solidão é que nós nunca estamos sozinhos no que sentimos”.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Depósito arbitrário, saldo inesperado.

Difícil entender porque as pessoas reclamam tanto das respostas que o universo dá as suas intenções. Muitas vezes contrárias ao esperado, mas muito fáceis de entender. Se o universo é como uma instituição bancária ou um fundo de capitalização onde depositamos nossos interesses para resgatarmos com bônus acumulados é natural que para cada investimento tenhamos um saldo a resgatar, seja ele bom ou ruim. Aquele conteúdo é resultado do que investimos, portanto é nosso dever assumirmos as consequências do que arbitrariamente aplicamos nele. Tenho andado muito atento a isso, por que qualquer investimento gera saldo a resgatar equivalente a intenção do depósito.

Para que você entenda porque este assunto pouco discutido merece reflexão vou citar alguns exemplos vividos bem recentemente onde seus protagonistas não gostaram do que receberam e tentaram justificar o “prêmio” com argumentos, digamos... incabíveis.


Na maternidade, a jovem e inexperiente enfermeira passa no final do horário do jantar para retirar a mesa deixada intacta pela parturiente. O marido, revoltado, se nega a deixar que a refeição fria e possivelmente infectada deixe o quarto. Seu argumento contra o protocolo do hospital é que mesmo duas horas depois de servida a refeição, sua mulher, em trabalho de parto, não teve como comê-la. Respeitando este protocolo a enfermeira retira o prato e deixa o marido profundamente irritado. Ele leva a reclamação à direção do hospital e, como esperado, fica sem resposta.
  
Um homem, que é assumidamente atrasado em todas as ocasiões, tem um acesso de raiva porque marcou um encontro e foi deixado esperando por mais de quarenta minutos pela mulher. Quando ela chegou, ele se sentiu no direito de se escandalizar com o fato e cobra-la, rispidamente, pela falta. E o seu comportamento, sempre-atrasado, encarado com tolerância pela mulher até então, passou a ser considerado desrespeitoso, grave e intolerável. Era melhor ter ficado quieto. 

Um grupo de jovens esportistas definiam seus encontros através de um chat para que assuntos pertinentes ao hobby fossem tratados e que todos fossem notificados e participassem dos encontros. Um deles aproveita a boa audiência e usa o canal para tratar de outros assuntos que divergiam do interesse do grupo e em consequência do mau uso é excluído. O jovem, que por razões óbvias não concordou com a atitude do grupo, sequer reconheceu seus excessos e se desculpou, preferiu se afastar vitimado. 

Exemplos como estes deixam claro que muitos dos nossos aborrecimentos são respostas aos nossos comportamentos arbitrários aos pequenos protocolos que mantêm os microssistemas funcionando. Se queixar porque o segurança do banco não permitiu a entrada às 16h10; reclamar com o vendedor de uma loja de sapatos que a liquidação acabou da noite para o dia ou revoltar-se contra uma companhia aérea que cobra o dobro do valor do bilhete para trocar o nome do passageiro de um voo concorrido são provas que tentamos atropelar alguns serviços que foram pensados para funcionar em benefício de nós mesmos. Estes exemplos servem para nos ensinar que devemos ter atenção as nossas escolhas e que devemos concentrar os nossos interesses em atitudes que levam ao bom funcionamento destes sistemas, porque geralmente brigamos para ter direito a coisas que já nasceram cobertas de regras para que funcionem bem. Caso contrário, ainda não existiriam, o que seria um atraso muito maior.

Então fica a dica: Antes de reclamar de algo pense em quem de fato tem razão. Pense que a esfera social é bem maior que o seu problema pessoal. Saia de casa mais cedo. Aproveite para resolver os problemas na primeira vez que pensou neles e lembre-se, a porta do banco trava para a sua segurança.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Diário de Bordo / Europa 2012 – Parte 1.


ROMA.
 
Uma das minhas maiores ambições é sem dúvida o conhecimento. Acredito que de tudo que nos possa ser tirado, o conhecimento é a única coisa que só se perde com a insanidade e a morte. Pobre ou rico tendo ou não onde se sentar, para contemplar o conhecimento basta apenas interesse no coração e tempo para se dedicar.
 

Sou daquelas pessoas que demoram a acreditar no que os olhos vêem e que precisam tocar em tudo para terem certeza de que algo “É” realmente. Imaginem esta pessoa solta numa cidade em que cada coisa parece existir para te chocar. É um “parque de diversões” do conhecimento onde a presença do homem está marcada por milênios de existência cognitiva na mínima pedra que fazemos rolar ao subir a colina do Palatino Romano. É diferente de tudo que se pode ver e sentir porque a nossa percepção parece não estar adaptada para tanto tempo de história. Parece mentira. Cenário idealizado para atrair turistas curiosos. 

Algumas vezes não fazia diferença se uma coluna ou muralha tivesse sido criada no século III a.C ou XI d.C. porque minha mente processa a informação de forma analógica. Ou seja, preciso que todo processo seja representado em escala do começo ao fim, como no velocímetro do carro. Talvez porque minha cultura e a forma como aprendi a “curta” história do Brasil funcione como uma escala. Cabral sai de Lisboa a caminho das Índias e no dia 22 de abril de 1500 descobre, sem querer, o Brasil. Depois disso, sai ouro, entra navio, rompe-se o tratado de Tordesilhas, chegam mais navios portugueses, holandeses, franceses, etc. Nasce um bebezinho lindo na França e dão a ele o nome de Napoleão Bonaparte. Depois de crescido, ele resolve conquistar a Europa e põe pra correr a família real portuguesa que entre China, África, Índia e Brasil, escolhe o último destino por ser mais perto ou simplesmente porque tinha que ser assim. É abolida a monarquia, entram os militares, depois os presidentes civis e agora somos a sexta economia com a Dilma na direção. Uma linha do tempo complexa, mas breve em seus 500 anos de história. 

Na Roma Antiga esta “escala” pula do século XIV para muito antes de Cristo e entre tantos imperadores se sobrepondo fica muito difícil entender a sucessão. Cada um querendo aparecer mais que outro, construir templos mais magníficos, conquistar cada vez mais territórios e tantas outras coisas. No final aquilo virou um tormento na minha cabeça e já não me interessavam as histórias de Júlio César, Augusto, Cláudio, Calígula ou Tito. Eu confundia todos os períodos e busquei entender apenas o que estava tão bem representado no contexto histórico: a beleza da cidade e o poder do acaso. Não meramente o acaso, mas muito dele.

Depois que a Roma antiga havia passado (nem tanto porque toda hora se tropeça em algo) outra cidade se apresentava, a religiosa, ou Roma Cristiana como eles chamam. No Estado do Vaticano fui visitar a magnífica Basílica de São Pedro e seus tesouros. Fiquei muito tocado pelo fato de que foi provado que sob o altar da basílica está enterrado São Pedro, um dos doze apóstolos de Jesus e o primeiro Papa. Por esta razão, muitos Papas, começando pelos primeiros, têm sido enterrados neste local. Sempre existiu um templo dedicado a São Pedro em seu túmulo. Inicialmente era extremamente simples, mas com o passar do tempo os devotos foram aumentando o santuário, o que culminou na atual basílica. Embora a Basílica de São Pedro não seja a sede oficial do Papado, certamente é a igreja que mais conta com a participação do Papa. Uma vez que a maioria das cerimônias papais é realizada ali devido à sua dimensão, à proximidade com a residência do pontífice e à localização privilegiada no Vaticano.

Depois da basílica de São Pedro foi a vez do Museu do Vaticano, antiga residência papal. Obras magníficas desde a Roma Antiga até o Renascimento estão catalogadas e expostas nos seus salões ricamente decorados pelos maiores artistas de todos os tempos. Entrar na Capela Sistina, onde se realiza o Conclave (eleição do novo papa) e perceber que a obra A Criação de Adão, de Michelangelo, é de longe a mais interessante, foi como andar nas nuvens. Mesmo com uma multidão vazando pela porta como água. Hoje, quase um mês depois, me lembro apenas do que meus olhos viram e das sensações na pele, do ar frio circulando e dos rostos paralisados diante de tanta beleza. Não tenho registro de som algum no local, apesar de lotado. Só me lembro daquelas imagens quase pingando do teto.

Quando eu cheguei a Roma não tinha muita noção da força que a cidade exercia sobre sua própria atmosfera. Parece que existe um vórtice que joga o ar de todos os cantos para dentro dela. É uma energia muito forte, uma pressão contra o solo. Com tanta beleza e riquezas de valores históricos inestimáveis não poderia ser diferente. Muitos comentam sobre a energia que emana do Coliseu, mas que eu não senti. É magnífico. Mas devido ao tempo, os espíritos dos gladiadores devem tê-lo abandonado e hoje é um lugar de paz. A Pietá de Michelangelo, dentro da Basílica de São Pedro, está tão longe do público que através dos livros é possível ter uma ideia melhor da sua beleza. O Panteão de Agripa (27 a.C.) permanece fiel à sua forma original, apesar de ter sido destruído por um incêndio e reconstruído por Adriano em 127 d.C. É preciso entrar nele e ler sua história mais de uma vez para se ter noção da sua grandiosidade. O Vaticano e suas conquistas papais ergueram um estado rico com relíquias dignas dos mais antigos reinados e uma história de poderes que homem algum jamais terá novamente. Tudo junto e misturado num transito infernal com calçadas repletas de indianos e africanos praticando o comércio de todo tipo de quinquilharias e artigos de luxo falsificados. São milhares de pessoas nas ruas, o que torna difícil identificar quem é turista ou cidadão, salvo pelas caras perplexas a cada esquina. 

Ficam as dicas:

1- Roma é muito cara. Programe sua estada com toda cautela para não desperdiçar seus Euros. Vale a pena passar nos mercados e abastecer o quarto com sucos, iogurtes, pães e outras delicias que você só encontra na Europa;
2- Não compre o Roma Pass, ticket que te dá direito a entrada nos museus, Forum Romano, Vaticano e etc. Custa €90,00 e te aprisona por 3 dias. Crie um roteiro de acordo com seus interesses, assim ficará mais satisfeito;
3- Se você não fala italiano, fale pelo menos inglês. Mas se não falar nenhum dos dois vá assim mesmo;
4- Prefira fazer todo percurso na cidade a pé, o transito é louco e os pontos turísticos não são distantes um do outro;
5- A cidade é muito mal sinalizada, leve seu guia de Roma em português para garantir.
6- A noite em Roma é parada. Não vá pensando em grandes emoções, baladas e afins porque a frustração é certa;
7- O Coliseu e a Fontana de Trevi devem ser vistos durante o dia e também a noite. São dois momentos que fazem a diferença no olhar;
8- Compre só a primeira garrafa de água e depois reabasteça pela cidade. Existem mil fontes de água potável, uma em cada esquina.
 

Aproveite!
L.P.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

"Na Boa" ou "De Boa"?


Ultimamente tenho ouvido muita gente falar "de boa" para cá "De Boa" pra lá, mas sinto informar que esta expressão não existe, a maneira correta de ilustrar o que se pretende é "Na Boa". Esta expressão nasceu no Rio de Janeiro entre as décadas de 60 e 70 e exprimia o estado de espírito do carioca, praiano, sempre "relax" nas tardes do posto 9 em Ipanema. A "Boa", neste caso, eram as tardes ensolaradas e tranquilas de praia e para ilustrar que não existia maneira melhor de levar a vida nasceu a expressão "Numa Boa", que depois virou "Na boa" e que hoje dizem "De Boa" (horrível e incabível). Acontece que o Estilo de Vida Carioca virou moda no Brasil e no mundo e, além da beleza da cidade e do povo, nossos maneirismos também viram desejo de domínio e com isso o "Na Boa", entre outras expressões, ganhou outros territórios e novas adaptações. Até aqui tudo bem, o idioma, por ser uma língua viva, vai mudando ao longo das décadas e sofrendo interferências de outras culturas e até dos avanços tecnológicos, mas a contrapartida de tanta mudança é o caráter de patrimônio oral, cultural e imaterial de uma nação, ou região de onde é original, que a língua tem. Por isso mesmo deve ser defendido.

Agora vamos fazer um teste prático para ter certeza que a expressão não foi bem adaptada devido a questões gramaticais. Troque a preposição EM, que exprime ideia de lugar onde se está, mais o numeral UMA (em + uma = NUMA), pela preposição DE, que exprime apenas relação entre palavras, e no final coloque um sentimento qualquer, por exemplo, alegria. Percebeu como não faz sentido e é horrível?!

Não sei quem mudou nossa expressão de “Na Boa” para “De boa”, alguns dizem que ouviram a primeira vez em São Paulo, outros em Brasília e há quem diga que nasceu em algum lugar do Sul, mas o fato é que virou febre em todo Brasil. Como filho do Rio de Janeiro e interessado na perpetuação da minha cultura faço deste texto um manifesto para que os meus conterrâneos, pelo menos, voltem a usá-la como foi originalmente criada. Neste caso não existe o desuso para justificar a mudança do hábito, pois desde que me conheço por gente, e isso já faz tempo, ouço as pessoas dizerem da forma correta, e hoje, até algumas pessoas que falavam corretamente aceitaram a proposta “estrangeira” e já aderiram ao modismo.

Pensei muito se escreveria ou não sobre isso, apesar do incômodo, porque não queria parecer bairrista, mas a vontade que tenho de corrigir as pessoas é tão grande que às vezes sinto minha boca balbuciar involuntariamente a expressão correta.

Na boa, cansei! 

L.P.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Viva a Diferença.

Para Fabricio Pietro, Donna Piedade, Gabriel Bittencourt, Rodrigo Feijó e Ricco Haddad.

Vocês já repararam que o que deveria ser positivo para unir acaba distanciando? Ser parecido, similar, idêntico, acaba transformando tudo em uma maçaroca previsível e, no final, ninguém sabe se a zebra é branca com listras pretas ou o contrário.  Se nos detalhes em que nos identificamos com o outro não conseguimos suportar o comportamento refletido, quando somos muito diferentes a história também acaba não dando muito certo porque não estamos interessados em ceder. Na verdade se doar. Não existe “cristo” algum que seja nossa metade da laranja - ou outra figura de linguagem que nos remeta à alma gêmea - sem oportunidade de se apresentar, escolher suas armas e partir pra dentro. Disponibilidade é um “estado de espírito” que faz com que alguns relacionamentos deem certo. Principalmente aqueles que exigem tempo pra acontecer.  Uma boa diferença faz a descoberta ainda mais excitante. Lidar com o inusitado é muito mais interessante. Ser o “oposto-disposto” é o arranque da conexão.

E por falar em conexões e diferenças, na minha última visita à São Paulo reencontrei alguns amigos do Rio que mudaram de cidade em busca de novas oportunidades. Fiz também novos amigos de todos os cantos do Brasil unidos pela afinidade. A impressão que eu tive diante de tanta novidade foi que todos se recaracterizaram no cosmos paulistano. Por mais indiferente que o indivíduo possa ser a toda diversidade, a megalópole brasileira realça o nosso desejo de pertencer a um universo que dita as novas regras urbanas e que liga o Brasil ao mundo pela contemporaneidade, comportamento social, produção artística, pela vasta oferta de serviços ou simplesmente pela capacidade de fazer dinheiro.
Em determinadas esquinas de São Paulo você não consegue identificar a cidade como brasileira devido a esse portal aberto para o mundo. Poderia ser Madri, Nova York, Sidney ou Buenos Aires. E é exatamente por isso que a cidade atrai pessoas de todos os cantos. Espíritos desbravadores e ambiciosos em busca do sucesso profissional e/ou alguma experiência que nenhuma cidade brasileira seria capaz de oferecer.

Acredito que as diferenças que separam Rio e São Paulo sejam as melhores coisas entre as duas cidades. Tanto a cultura do povo como as características geográficas e climáticas nos fazem perceber que uma cidade como o Rio de Janeiro jamais poderia ser como São Paulo por sua natureza turística. É quase impossível dissociar o Rio de Janeiro do cheiro de bronzeador na pele morena dos corpos sarados na praia de Ipanema para associá-lo aos negócios e a um horizonte de alvenaria espelhada. São Paulo é dinheiro e Rio é qualidade de vida (se não para todos, pelo menos para os mais sortudos).  Dinheiro também é qualidade de vida, mas viver bem é tão bom quanto ter dinheiro e, por isso, o Rio ainda é a opção de muita gente.

Assim como as pessoas nascem para aquilo que elas são, as cidades também têm características e peculiaridades que influenciam a personalidade dos seus cidadãos. Cada indivíduo possui um conjunto de diferenciais que o torna único no meio social. Mas diante de tanta diferença, ainda temos um marcador genético que nos faz pertencer ao território no qual fomos originados. Enquanto nativos, somos células que carregamos o DNA da polis e divulgamos sua estrutura social. Jamais pertenceremos a lugar algum se não formos nascidos nele ou tivermos vivido tempo suficiente para nos identificarmos.  Assim como BH é a cara dos mineiros, Belém não poderia ser em outro lugar senão no Pará. E os cariocas não seriam, por definição, um povo feliz (apesar dos pesares) se não tivessem o aporte do Rio de Janeiro. 

Desde que deixamos de ser nômades e começamos a renovar os recursos de um território, passamos a trocar com ele suas características e pudemos enfim nos classificar e ser reconhecidos pela nossa natureza geográfica. São por estes e outros motivos que a crítica entre os gentílicos se torna um discurso vazio do ponto de vista cultural. Não existe a possibilidade de atuarmos no contexto nacional como iguais porque essa diferença é fundamental para enriquecer nosso país e desenvolver nossa cultura.  

Viva a diferença! 
L.P.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Escolhas e Sentenças.

Para Claudio Cunha, Tony Lopes e Dill.

As vezes a perplexidade nos torna imóvel diante de um fato. O que fazer depois disso, eis a questão. Banalizar talvez seja mais fácil, você deixa passar acreditando que não tem jeito e segue a vida. Se a opção for refletir, isso pode dar mais trabalho, porque toda reflexão é digna de uma conclusão, e para valer o tempo dedicado a todo o processo é preciso agir. Por outro lado a ignorância é uma dádiva, quanto menos sabemos sobre algo, mais distante da indignação e do recalque. Você simplesmente aceita e acredita que era o "plano de Deus" reservado para você, mas quem vai nos convencer que o plano de Deus era nos ferrar e nos ver derrotados? Não existe “plano de Deus” para derrotar ninguém, o que existe são as escolhas que esquecemos que fizemos e as parcelas fixas que pagamos por elas pelo resto da vida. Deus é benevolência para quem acredita nele.

Eu e um amigo resolvemos assistir Heleno, filme dirigido por J. Henrique Fonseca, produzido e muito bem estrelado por Rodrigo Santoro. A narrativa não é das mais dinâmicas e a introdução se arrasta um pouco até arrancar, mas do meio para o final a gente até esquece como o filme começou porque somos arrebatados pela perplexidade. Não importa se a produção é ou não biográfica, o que importa é a discussão sobre o comportamento de um mito que esqueceu que era gente.

Naquela sala 60% ocupada, vários Helenos olhavam para a tela sem se reconhecerem. Homens e mulheres que não fazem ideia de que cada cobrança da vida paga com sangue foi uma escolha errada no passado. As vezes pecamos sem noção e pagamos o preço sem sentir. As vezes percebemos o erro, mas não voltamos atrás e deixamos a poeira e a escuridão do passado encobrir o mal feito e lá na frente nunca sabemos como lidar com o resultado. Tudo tão antigo e "autoperdoado" que já não faz mais diferença. Muitas vezes temos menos de 48 horas para voltar atrás de uma decisão ou de um mal feito porque depois disso nos perdoamos a até romantizamos o erro. Repeti-lo e banalizá-lo depois é tipicamente humano, mas até para ser mal caráter precisamos ter noção do mal de que somos capazes de fazer para orgulho e próprio perdão.

Heleno de Freitas foi um craque dito genial, destemperado, doente e imaturo. Teve oportunidade de fazer diferente, mas a arrogância não lhe permitiu enxergar sua condição humana que pouco a pouco tornou-o frágil e tirou-lhe a única coisa que não era devida, sua glória. Muita gente diz que não temos como controlar os eventos do destino, mas acredito que podemos organizar nossas vidas para que esses eventos funcionem ao nosso favor. Vejo muita gente de bem e competente que consegue quase total controle sobre o incontrolável porque estão atentas e dispostas em cada escolha. Porque respeitam a integridade alheia e por conseqüência a própria integridade. O mínimo se reflete no máximo. É como escolher o sapato errado, estragar o look e ficar a festa inteira se penitenciando por isso. As outras pessoas podem não perceber, mas você sabe e isso já é suficiente.

Ainda hoje eu me cobro sobre algumas escolhas que fiz e pago minha sentença sem culpar Deus ou meus pais por minha imaturidade. Tenho certeza que, seja o mito Heleno ou um mortal como eu e você, todos nós atingimos o discernimento em algum momento e mesmo no silêncio dos nossos pensamentos nos declaramos culpados, porque se a culpa nasceu de uma péssima escolha então não tem porque atribuir a Deus ou a terceiros a merda que escolhemos para nós.
Se não tiver conserto, engula o choro e aguente firme!

Até a próxima.
L.P.

terça-feira, 3 de abril de 2012

A Semente da Dúvida.

Para o meu querido amigo Nuno Borges.

Não faz muito tempo ganhei de uma pessoa muito especial um livro sobre mitologia grega. Na época eu estava lendo outro lançamento importante e acabei não dando muita importância ao novo livro, que ficou esquecido no armário. Lembro-me que li poucas das tantas histórias reunidas no volume, e agora, tanto tempo depois, lembrei-me dele, retirei a poeira e o abri aleatoriamente.

No capítulo o autor contava a história sobre o amor de Zeus e Sêmele, o deus-pai do Olimpo e a filha de outros dois personagens importantes ligados à mitologia. Na ocasião deste amor, Zeus ainda era casado com Hera, sua irmã, mas se apaixonou perdidamente por Sêmele, uma mortal nobre, muito jovem e extremamente bela. Zeus não escondeu seu amor do Olimpo nem de sua mulher atual, mas teve que manter sua forma divina disfarçada sob a imagem de um belo rapaz para proteger a amada da morte, pois sua luz e glória destruiria qualquer ser vivo que presenciasse tamanho esplendor.

Hera, muito enciumada, sabendo disso, desceu a terra e se disfarçou de uma ama de Sêmele e durante uma conversa trançou em seus cabelos a semente da dúvida contando-lhe que aquele homem que jurava ser o grande e divino Zeus poderia estar tentando enganá-la, porque ele não parecia ser mais do que um simples mortal. Como Sêmele poderia saber que ele era realmente o divino Zeus? Sêmele estava convencida de que se tratava de Zeus, pois o jovem era o mais belo entre todos os homens da terra. Hera lhe interrompeu antes que a razão lhe abrisse os olhos e sugeriu que da próxima vez que ele dissesse a ela que era Zeus, Sêmele deveria pedir-lhe para que jurasse pelo Estige (esse é um juramento que nem mesmo os próprios deuses podem quebrar), que estaria disposto a lhe dar seja o que fosse o que ela pedisse. “Ordene-lhe que se apresente aos seus olhos com todo o poder e a majestade de sua natureza divina, como quando ocupa o trono do Olimpo”, disse Hera a Jovem Sêmele.

Quando Zeus entrou em seu quarto naquela noite Sêmele não o olhara como um imortal, mas como um simples rapaz e o fez jurar pelo Estige que ele faria qualquer coisa que ela pedisse e diante de seu amor Zeus o fez. Quando Sêmele terminou, o deus a alertou sobre o que poderia acontecer e mesmo assim, movida pela intriga de Hera, a jovem insistiu e foi destruída diante da glória do senhor do Olimpo, destruída pela verdade que ela ignorou baseada no ciúme e na inveja de outra mulher.

Não faço ideia de quem escreveu este conto, nem há quantos séculos atrás, mas os antigos já sabiam que a dúvida era devastadora, que a intriga pode nascer na forma de fofoca ou de um conselho e que precisamos estar atentos quanto a quem nos acaricia e nos sorri. Devemos olhar com a razão sem esquecer que às vezes nosso coração nos cega. Refletir sobre qualquer acontecimento e dar tempo para as coisas assentarem. A solução costuma nascer naturalmente meio ao caos. Ter paciência para esperar o melhor momento para resolver um problema diminuindo as consequências e preservando quem a gente ama de verdade. Não sei se ter trinta e poucos anos ou milênios de existência atenua o impacto que uma atitude mal pensada do outro pode causar, mas conduzir com maturidade uma crise, seja em casa ou trabalho, certamente faz muita diferença. O que poderia durar só até amanhã pode ser para sempre se respeitarmos os caminhos por onde o bom senso nos conduz.

O pecado de Zeus, em minha opinião, foi acreditar que toda sua onipotência bastaria, que todo o seu poder seria suficiente para proteger seu intuito. Ele não contava que do coração de Sêmele, que enchera de confiança e amor, brotaria dúvida tão cruel.

Da desgraça de Sêmele nasce a moral do texto:
Heras sempre existirão a nossa volta, mas na dúvida, cale-se. Nada é mais constrangedor que a verdade quando não estamos preparados para ela.

L.P.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Poesia Versus Tecnologia

O que me inspirou escrever desta vez não foi o amor, apesar de ser movido por essa força em tempo integral, mas a saudade, a certeza que um dia não teremos mais referencia da nossa infância, adolescência e dos tempos antigos que contam e nos ensinam com suas tantas histórias maravilhosas. Não me refiro ao desaparecimento dos registros daquela época, graças à tecnologia eles estão cada vez mais limpos e acessíveis, mas a produção de experiências de maior valor qualitativo em menos quantidade. O que me inspirou escrever este texto foi a espantosa rapidez com que uma curiosidade pode ser satisfeita em três passos simples: 1º - Shazan (aplicativo para smartphones que reconhece qualquer música e retorna todas as informações sobre ela), 2º - Google (este dispensa apresentações), 3º  - Youtube (além de dispensar apresentações é uma das maiores invenções dos tempos modernos).

Tudo começou com o meu insistente interesse por uma música de um filme em cartaz no Telecine. Aquela melodia estava intermitente na minha cabeça a mais de uma semana, até que resolvi aplicar os três passos acima e me deparar com uma performance de Elvis Presley, ao vivo, em 1970, de Sweet Caroline. Além do próprio Neil Diamond, seu autor e interprete. Tão lindo ver aquilo que uma coisa foi me levando a outra e acabei dormindo as 3h da manhã extasiado e  muito emocionado.  Neste caso a tecnologia me ajudou a ter acesso à poesia, mas, e quanto às próximas poesias desta categoria? Quem terá tempo de criá-las com tanta pressa de produzir novidades para girar o capitalismo e alimentar a ambição? Concordo que os avanços tecnológicos são importantíssimos para o progresso nos tratamentos de doenças graves, para gerar lucro, possibilitar novas descobertas além de promover qualidade de vida para o cidadão comum, mas a tecnologia nos viciou em soluções rápidas, acesso rápido à informação e a substituir com a mesma rapidez nossos encantos e nos tornar monstros de carência sedentos por novidade e movimento. Estamos mais conectados a cada dia através da rede e menos conectados fisicamente uns com os outros. Consumimos tudo com muita voracidade e temos cada vez menos tempo e interesse no indivíduo (não vou falar de amor e sexo agora).

Com os avanços tecnológicos a população comum não “descobre” mais nada, apenas acessa o pioneiro, e eu acredito que de alguma forma isso interfira na descoberta de novos artistas que deveriam suprir de poesia os novos tempos. Há tanta pressa em se criar ídolos para fazer dinheiro que não sobra tempo de achar artistas genuínos. Se a paixão move a arte, a insistência é a responsável pela excelência dos resultados dela. Se esses artistas não tiverem tempo de transpirar essa paixão, ela deixa de ser uma força motivadora e se torna uma máquina de frustração porque o tempo é fundamental para a maturação das “idéias” e haja tecnologia ou não este processo é do homem, não tem como acelerar. Quanto a isso não existe ciência que dê jeito (espero!), o homem é fruto da convivência e a ciência e a tecnologia só deveriam melhorar isso, não nos afastar um do outro.

A tecnologia viabiliza tudo que a ciência leva décadas para descobrir, cria mecanismos curiosos e simples para tonar processos intrincados em cultura pop - smartphones, tablets, computadores, monitores de glicemia, aparelhos de Ultrasom 4D do tamanho de celulares, etc –, mas está alheia a poesia, ao romantismo, a arte genuína e ao olhar diferenciado. A tecnologia não bloqueia o processo criativo, muito pelo contrário, possibilitam novas ferramentas para se alcançar resultados, mas nos viciou em velocidade e urgência nestes processos, que para determinadas realizações, só faz atrapalhar.

Haverá um tempo sem equivalentes para Elvis, Machados de Assis, João Ubaldo, Calderon de La Barca, Buñuel, Dalí, Garcia Marques, Dickens, Hendrix, Simone de Beauvoir, Vinicius de Morais, Elis Regina, Saura, George Bizet, Beethoven, entre outros tantos gênios que nos presenteou com um legado artístico inacreditavelmente rico e que servem de referência para os nossos contemporâneos. Desejo que o homem acorde a tempo de aproveitar sua vida com as facilidades que a tecnologia promove sem ser um escravo perpétuo dela. Que troque tardes inteiras dedicadas ao Facebook, consoles de games e outros bichos tecnológicos ao ócio criativo, ao mar, ao Parque do Flamengo, à música, à insistente gota d’água nas Paineiras e outros passaportes que expandam a criatividade. Para que a tecnologia não se oponha a existência da poesia e do romantismo, mas seja uma ferramenta para sua divulgação e propagação só depende de nós, da maneira como vemos o mundo e do que esperamos para o nosso futuro em longo prazo.  Desejo que o homem escreva mais, corra menos, exponha suas idéias por mais absurdas que possam parecer para mim ou para 6 milhões de pessoas, mas que alcance o coração devido e seja a gênese de uma linda poesia que nos faça pensar e garanta um sorriso quando tudo parecer plástico e com gosto de comida congelada.

Até a próxima.
L.P.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A Minha Versão do Amor.

É fato, quanto mais me afasto da adolescência e daqueles tempos de ebulição hormonal, mais próximo da verdade e da minha própria versão dos romances eu fico. Quem me acompanha no blog deve estar se perguntando por que eu volto tanto a este assunto. A minha resposta é a seguinte: Enquanto eu não entender esse mecanismo perturbador da química do amor eu não vou parar de refletir a respeito (ou até que alguém me ajude a entendê-lo), porque já perguntei a um monte de gente competente e de sucesso no negócio sobre estes mecanismos e as respostas mais próximas do esperado tinham a ver com dogma, mitologia ou redenção total, e isso não me interessa.

O sentimento pode até ser imprevisível, mas o homem ...

Das coisas típicas do amor:

Todas as vezes que a “coisa” aconteceu, a carência era mais nítida do que a afinidade e a admiração. Tinha sempre alguém na merda e alguém a fim de comer gente. As frestas que se permitia ver além da cortina eram estreitas e mal iluminadas e a “coisa” toda acontecia como um milagre. Esqueçam do amor incondicional, o tal amor a primeira vista e outros amores imortalizados no cinema. Estou falando de vida real.
O amor, como o chamam, em minha opinião, é um amontoado de coisas confusas a meia-luz, sob uma camada espessa de conformismo, dependência, vista grossa e amizade, que por falta de outro nome, chamamos de amor. A coisa é tão louca que antes de nos declararmos nunca sabemos o que estamos sentindo. É uma mistura de cama boa, com ótima companhia e bom comportamento ético, mas isso nem sempre vem acompanhado de estabilidade econômica e impecável relação familiar, quesitos importantíssimos nos dias atuais. Aceitação e equilíbrio psicológico então... é pedir demais. Fica sempre uma coisa pela outra. Falta aqui, repõe dali, e no calor da crise de 1 ano nos perguntamos: “É isso mesmo que eu quero?!”. Conheço casais que estão juntos e nem sabem por quê. Conheço casais que se pudessem se matavam uma vez por semana para satisfazer a gana de ver o cônjuge calado um dia todo.

O amor nasce do drama: 

Acredito que o amor para se estruturar e se instaurar dependa de um grande drama na vida. Algo que gere gratidão, admiração ou até dívida mesmo, porque se o tal amor nasce de uma confusão de sentidos, quanto mais estranho o sentimento melhor. Morre o pai de um, o outro perde o emprego, alguém quebra a perna, um carro é roubado, a mãe surta. Se alguma coisa acontece e um ombro aparece, se não for amigo, vira amor! É estranho mesmo, mas se de um lado tem alguém que precisa, do outro terá sempre alguém disposto a ajudar, e se acabar em cama, vira namoro. Não é amor, mas tem gente que prefere chamar assim. Ainda falando do bom “ombro amigo”, aqui vai uma dica importante: Nunca ofereça um copo d’água a alguém que está sofrendo por amor, ombro então, jamais. Nessa de consolar Maria, João só descobriu que o amor não deu certo porque ele não era o Huguinho,  o Zézinho ou o Luizinho. Nesses casos deixa o ombro para o amigo gay.

Desprezo: o mapa do amor.

O próximo passo é a posse. Uma TV de LED só tem valor se tiver na parede da nossa casa. Se a mesma TV estiver na calçada sem dono, ela pode estar novinha, recém saída da loja, que ninguém vai se aventurar em leva-la para casa para testar. O objeto de amor e desejo de qualquer um não quer ser visto como uma televisão nova na calçada, mas se alguém a mantém na parede, sem uso, rola confusão. Todo ser humano, rico ou pobre, feio ou bonito precisa ser valorizado, até aqueles que odeiam bajulação amam ser bajulados, porque isso agrega valor ao produto. Como vou saber se ainda sirvo se ninguém senta diante de mim na sala, mas se eu for para a calçada ninguém vai me levar para casa, pode até pegar, mas vai deixar na calçada mesmo (rs).  É melhor eu brigar com quem me comprou do que deixar espaço para outra entrar. É mais ou menos assim que acontece nas relações. Despreze, e tará amor.
Se eu estiver errado, deixe um recado pra mim que prometo refletir.

Reinvenção do amor:

Minha versão para o amor não é aversão ao amor, é uma reinvenção dele mesmo porque vai mais longe. Antes eu ficava de olho nas entrelinhas, nos atrasos, nas frases incompletas, no celular no vibra call e na quantidade de vezes que o MSN apitava comigo no outro lado do telefone. Eu era um chato no quesito confiança, (putz, como vocês me agüentaram?). Imaginar uma sexta-feira sem mim, bordejos no calçadão, praia com a galera, chope fora de hora, compromissos estranhos, tias estranhas e até concursos públicos fora da cidade era papo de revolução e fim de caso. Com a popularização do Facebook e o advento do Grindr (Deus me livre!) decidi que antes de pirar eu vou me reeducar, ser mais relax, acreditar que o amor perfeito deve ser também um pouco cego e um pouquinho submisso para durar além do outono / inverno. Resistir ao verão e passar sem arranhões pelo carnaval e as férias alheias.

Minha versão pode ser estranha e muito mais confusa que o próprio amor, mas ela é acima de tudo real. Quando eu era garoto eu me apaixonava a cada 15 dias e sofria muito no final do ciclo porque não praticava a realidade. Hoje penso em outras coisas, outros pormenores que fazem desse amor menos fabuloso, onde os alfinetes, remendos e grampos aparecem sem fragilizar ou mesmo desvalorizar o produto. Todo amor é frágil por natureza, o que faz dele uma fortaleza é o quanto de empenho os envolvidos dedicam para guardá-lo e protegê-lo, respeitando as diferenças sem perder o carinho e a boa vontade. 

Falastrices e brincadeiras a parte, minha versão do amor é a minha reinvenção dele mesmo.