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Este blog não pretende ser correto, fonte de pesquisa ou referência para seus interessados. Ele foi pensado para que outros homens e mulheres entendam melhor como nós (homens) podemos ser românticos, chatos e invariavelmente humanos. O que pensamos das artes, das coisas que não entendemos e principalmente de nós mesmos. Neste blog há espaço para homens de todas as idades, raças, classes sociais e orientação sexual. É feito de pensamentos livres, sem dogmas culturais ou religiosos.


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terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

“A vida é aquilo que acontece enquanto você está fazendo outros planos”

“A vida é aquilo que acontece enquanto você está fazendo outros planos”.
Essa frase, que não faço a menor ideia de quem a escreveu, vem ecoando na minha cabeça faz semanas. Desde que eu a ouvi em um filme fico pensando que o autor escreveu para mim, sem saber. Sei que é pretensão demais achar que algo que foi dito, ou escrito, do outro lado do mundo encontra seu verdadeiro sentido quando acha a minha vida do lado de cá da Guanabara. Mas que parece, parece.

Durante todos esses dias que separaram a pior experiência da minha vida do presente momento eu penso em uma razão aceitável para perdemos, de uma hora para outra, alguém que tanto amamos. Como meu tio mesmo disse uma vez, eu perdi a única cesta onde depositei todos os meus ovos que juntei ao longo da vida e agora me encontro em um desamparo que mais parece um poço escuro e frio de onde passei a me relacionar com o mundo. Chova ou faça sol, o mundo está aqui e eu lá dentro olhando para as paredes e me perguntando, “porque, mãe?”.

Hoje recebi em casa um amigo de mais de vinte anos que me saudou com um emocionante relato que justificou um pouco mais as razões que temos para superar traumas como este. Disse-me que na época que minha mãe se foi ele estava viajando e quis muito me encontrar para dar um abraço e ajudar a sufocar aquela dor. Semanas depois, chorei no seu ombro, reclamei da vida, xinguei o mundo e culpei Deus pelo acontecido, só hoje, 485 dias depois (sim, eu conto as horas), um pouco mais conformado, mas não menos triste, entendi que o destino usa suas peças, neste caso eu e minhas experiências, para mostrar para os outros como corrigir suas trajetórias e ter uma vida mais feliz.
Imaginem o quadro. Ele é o sétimo e único filho homem de uma mãe que não teve a oportunidade de viver sua infância porque muito cedo precisou saiu do Nordeste em busca de recursos para criá-lo deixando-o com a avó. Aos dezesseis anos, quando enfim pode se juntar a ela, estava na ânsia adolescente de um lugar ao sol, movido por toda a sua trajetória familiar de luta, e mais uma vez adiou aquele convívio maravilhoso e necessário. Os anos se passaram, ele saiu de casa, trabalhou duro, casou, descasou, venceu e diante de um momento triste de um amigo, neste caso, eu, tomou a decisão mais esperada desde o anúncio da sua gravidez, viver enfim com a sua mãe, mesmo que em papeis trocados. Tive que me segurar para não me desfazer de novo em lágrimas quando ele disse que baseado na minha experiência de vida ele decidiu que viveria com ela, agora com 70 anos, até que algo muito importante os separasse novamente.

“A vida é aquilo que acontece enquanto você está fazendo outros planos”.

Este relato inicial, quase perdido no meio de tantos assuntos de trabalho, em duas horas que passamos juntos, abasteceu um pouco mais um dos meus reservatórios quase sempre vazios, o do conformismo. Se até ontem eu já tinha esquecido que para tudo na vida existe um propósito, hoje eu me lembrei de que até quando estamos tristes, nosso vazio pode compor a história de alguém e fazê-lo feliz de alguma forma. Não foi o que planejei para minha vida, sofrer tanto a falta de alguém ou servir de exemplo para a posteridade, mas se no final das contas o destino pendura nosso quadro na sala da casa de alguém para não deixar que a experiência seja em vão, tá valendo o esforço de entender que a vida é uma força para a qual não temos controle mesmo quando achamos que ela já está domada.

(Depois de publicado, um leitor me informou que o autor da inquietante frase é John Lennon, do álbum Double Fantasy, de 1980).